dezembro 05, 2010

Luís de Camões

Transforma-se o amador na cousa amada
Luís de Camões

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sómente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim coa alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma.

agosto 21, 2010

A ave



A ave é um símbolo de natureza arquetípica, dada a sua presença em todas as tradições e culturas. Basta pensarmos na pomba, na fénix, na águia, no falcão, etc.. É um dos símbolos mais poderosos da liberdade e da expansão da consciência. Dado que designa um ser que voa, é um símbolo utilizado para exprimir, de forma privilegiada, a relação entre o céu e a terra, entre o espírito e a matéria, entre o plano horizontal e o plano vertical.
Em grego, por exemplo, a palavra ave é sinónimo de presságio e de mensagem do céu. As aves simbolizam, pois, os estados superiores dos seres, daqueles seres que se libertaram do peso terrestre, e que assim ascenderam ao transcendente. Neste contexto, importa realçar a importância fundamental do voo, enquanto imagem da ânsia de ascensão, de verticalidade e de transcendência.
No Alcorão, o conhecimento espiritual, a verdadeira Sabedoria são designados por “língua das aves”. Na tradição hindu, a ave era um símbolo da amizade entre os deuses e os homens e, no Egipto antigo, representava a alma do defunto.
A pomba é, entre os cristãos, um dos símbolos da pureza, da paz, e a representação inequívoca do Espírito Santo. Recordemos que, no início do Génesis, o espírito de Deus se movia, como uma ave, sobre a superfície das águas primordiais.
A mais antiga demonstração da crença em almas-aves está, sem dúvida, contida no mito da Fénix. Designada como a ave de fogo, cor de púrpura (isto é, composta de força vital, solar), representava a alma para os egípcios. Segundo a lenda, após ter vivido muitos anos, a Fénix teve a coragem de se incinerar numa fogueira, regressando à vida mais bela e mais pura.
Os aspectos do seu simbolismo surgem aqui claramente: para que possa haver uma renovação da vida, é necessário que morram os aspectos mais negativos da psique humana. O homem novo só pode surgir quando tiver, em cada um de nós, morrido o homem velho.
Também a águia está presente em inúmeras tradições, simbolizando a realeza de Deus. É a rainha das aves, encarnação, substituto ou mensageira da mais alta divindade uraniana, e do fogo celeste, o sol, que só ela ousa fixar sem queimar os olhos. O ceptro de Zeus, pai dos deuses da antiga Grécia, era encimado por uma águia. Identificada com Cristo, esta ave exprime também a sua ascensão e realeza deste.
Na tradição iraniana, por exemplo, o falcão, ou a águia, simbolizavam o poder divino. Quando um rei lendário do Irão proferiu uma mentira, o poder divino abandonou-o sob a forma de um falcão. Nesse preciso momento, o rei viu-se despojado de todos os seus atributos, tendo sido, mais tarde, vencido pelos seus inimigos. E assim perdeu o trono.
Muitos dos aspectos aqui referidos mostram – embora de forma deveras sucinta – a importância simbólica da ave nas diferentes tradições e culturas de todo o mundo, pelo que podemos considerá-la um arquétipo. Daí a sua presença constante nos mitos, nas lendas e nos contos maravilhosos de todas as latitudes.

FOTO: Olhares

maio 10, 2010

Outras idéias



simples idéias
espaçadas na calçada
um passo aqui e outro distante
no meio do poço
e na sapiência

idéias do vento
que traz amor
e conhecimento

toque de vida
burla a pesquisa
viver é suave
diz a revista

dentro de si
há o botão
na ponta da lança
...
esperança


...

texto by Solange Mazzeto


DESCONHEÇO A AUTORIA DA IMAGEM

abril 06, 2010

Com licença poética - ADÉLIA PRADO

Com licença poética


Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.